É verdade... "Acabou-se a factura do Holocausto: os judeus de hoje acabaram com ela, cobrindo de vergonha o nome de Israel".
Estes não são as vítimas da shoah, os sobreviventes dos campos de extermínio nazis que, desprovidos de casas, de pátria e de esperança, se dirigiram no pós-guerra para o território da Palestina em busca de um lar para o povo judaico a que pudessem chamar pátria, numa epopeia relatada, entre outros, no romance “Exodus”, de Leon Uris. Estes não são os judeus que puseram de pé o sonho sionista de Theodor Herzl, depois concretizado por David Ben-Gurion. Estes não são os judeus vindos da Europa, África, Rússia, América, para então construírem de raiz um país novo sobre as areias do deserto, irrigando-o de água e de agricultura, povoando-o de kibutzes que eram um modelo de socialismo original e replicado em toda a organização de um Estado solidário e democrático, desde a Saúde ou o Ensino até às Forças Armadas, que logo garantiram a sobrevivência e independência do novo país. Estes não são os que fundaram o Estado de Israel que, não obstante as divergências políticas cedo ligadas à sua fundação, o mundo se habituou a admirar ou a invejar. Não: estes são os seus filhos, netos ou bisnetos. E o que eles fizeram e fazem com a herança recebida foi traí-la. Estes israelitas de hoje são os traidores da memória do Holocausto e do projecto sionista no que ele tinha de legítimo e de louvável.
Muito antes de Gaza, já Israel tinha perdido toda a legitimidade política para poder ser aceite como um Estado respeitador do direito internacional e caucionar os fundamentos da sua própria criação. Setenta anos de desobediência arrogante a resoluções do Conselho de Segurança da ONU, de ocupação sistemática e planeada, de terras roubadas aos palestinianos na Cisjordânia (onde hoje vivem em colonatos ilegais 800 mil judeus), de abusos de toda a ordem sobre os palestinianos, de paulatina expulsão dos palestinianos de Jerusalém, de transformação de Gaza no maior campo de concentração do mundo, do impulso dado à criação do Hamas, como forma de minar o poder dos moderados da Autoridade Palestiniana, conduziram àquilo que Guterres disse, com toda a razão, serem os antecedentes do 7 de Outubro. E, depois disso, os 36 mil mortos de Gaza, uma Força Aérea que bombardeia tendas de refugiados, um Exército que ataca dentro de enfermarias de hospitais e despeja mísseis sobre carrinhas de ajuda alimentar, valas comuns onde as outrora gloriosas FDI enterram centenas de civis, mulheres e crianças, ou o embargo deliberado de água e alimentos para também matar pela fome, pela sede e pelas doenças, tudo isso faz hoje de Israel um Estado criminoso que nenhum critério de decência pode absolver. Acabou-se a factura do Holocausto: os judeus de hoje acabaram com ela, cobrindo de vergonha o nome de Israel.
Olhamos para as imagens dos prédios de Gaza arrasados pelas bombas de uma tonelada e vemos as imagens do gueto de Varsóvia destruído pelos nazis: são iguais ou piores. E não vale a pena virem com o argumento de que o Hamas é o culpado porque usa a população civil como escudo: claro que sim, como o faziam os resistentes judaicos no gueto de Varsóvia, os russos em Estalinegrado ou qualquer força militar acossada dentro de uma cidade — ou esperavam que o Hamas saísse dos túneis e das casas e enfrentasse os tanques e a aviação israelita em campo aberto? Mas também olhamos para os rostos das crianças esfomeadas em Gaza e vemos os mesmos rostos de Treblinka ou Auschwitz e então perguntamo-nos: como é que os descendentes dos que passaram pelo Holocausto são capazes disto? Como é que falam com os seus antepassados, como é que não estremecem de vergonha? Porque a pior vergonha não é ver Netanyahu e o ministro da Defesa Gallant alvo de um pedido de captura do Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes de guerra e crimes contra a Humanidade ou ver Israel alvo de sentenças, que não cumpre, do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ). A pior vergonha é perceber que todo o povo de Israel, ou quase todo, está solidário com eles, solidário com um Governo de criminosos. As manifestações que vemos em Jerusalém ou Telavive não são contra o massacre em Gaza, não são a pedir uma solução de paz definitiva ou, muito menos, a pedir a solução de dois Estados. São a pedir uma trégua provisória que permita a libertação de todos os reféns e depois a continuação da operação em Gaza — se possível, com a expulsão de todos os 2,3 milhões de palestinianos que lá estão para o Sinai egípcio, para a Jordânia ou para Marte, o sonho e a “solução final” a que Israel aspira. Se em Gaza as Forças Armadas conduzem uma estratégia de genocídio controlado, na Cisjordânia ocupada os colonos civis não estão parados: 700 palestinianos foram já mortos às suas mãos desde 7 de Outubro e também eles atacam carrinhas que vão levar comida a Gaza cercada. Não há inocentes ali, não há vozes em Israel hoje, como sempre houve no passado, a demarcar-se desta bebedeira colectiva de ódio, de cegueira e de arrogância.
Se o TIJ — que é um órgão das Nações Unidas cujas sentenças são de cumprimento obrigatório pelos membros da ONU — ordena que cessem imediatamente as operações em Gaza, Israel responde dois dias depois com o massacre de 50 civis a que chama “incidente trágico”. Se o procurador do TPI pede mandados de captura contra membros da direcção do Hamas e do Governo israelita, Israel escandaliza-se por porem um país “democrático”(?) ao nível de uma organização terrorista, como se os mortos pelo terror distinguissem a origem política da bomba que os matou. Se três países europeus decidem, ao fim de 74 anos de uma resolução da ONU, reconhecer o Estado da Palestina, o incendiário ministro dos Estrangeiros de Israel declara-os aliados do Hamas. E se alguém, em algum lado do mundo, seja numa universidade americana ou num jornal português, no uso do mais elementar exercício de decência e de indignação, se manifesta com o que vê em Gaza, logo saltam os muitos defensores de Israel com a estafada chantagem intelectual de confundir indignação moral com anti-semitismo e deterem-se só um passo antes de os acusarem de nazismo. Até já vi com os meus olhos o que não acharia possível: o deputado europeu do CDS, e parece que professor de direito internacional, afirmar na televisão que era discutível que o ataque da Força Aérea israelita ao consulado do Irão em Damasco, em que morreram oito pessoas, fosse ilegal.
Na televisão também vi há dias o ministro Paulo Rangel explicar a posição portuguesa no conflito e por que razão este não é o momento para reconhecer o Estado palestiniano. Não consegui enxergar uma só razão válida, tirando o facto de nunca ser o momento certo, desde que em 29 de Novembro de 1947 as Nações Unidas partilharam o território da Palestina, sob mandato britânico, entre um Estado palestiniano e um Estado de Israel. O Estado de Israel existe desde que Ben-Gurion o proclamou em 14 de Maio de 48 e logo foi reconhecido por inúmeros países. O da Palestina continua à espera do “momento oportuno”. Valha-nos que pelo menos — ao contrário dos americanos e de vários parceiros europeus, campeões dos direitos humanos e da indústria do armamento — não fornecemos armas para a matança de Gaza.
Mario Pinheiro - A Europa tem sido chantageada à conta do antisemitismo. Condenar Israel pelo comportamento dos seus governos é uma questão ética.
David Ribeiro - As notícias de ontem [domingo 2jun2024] dizem estar o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, não só sob imensa pressão das famílias dos reféns ainda nas mãos do Hamas, mas também da Casa Branca, para aceitar a proposta de Biden de um cessar-fogo em Gaza, enquanto os seus aliados de extrema-direita ameaçam colapsar a coligação governamental se ele o fizer. E, ao que parece, Netanyahu lida mal com a paz.
Carlos Miguel Sousa - David Ribeiro Between a Sword and a Hard Rock.
Jorge Veiga - Uma coisa é a reacção ao ataque terrorista do Hamas. Outra coisa e a destruição de pessoas e bens, que nada têm com aquela acção.
Pois... era de esperar
Uma sondagem de opinião pública realizada pelo Centro de Mídia e Comunicação de Jerusalém, em cooperação com a ONG alemã Friedrich Ebert-Stiftung, na Cisjordânia ocupada, incluindo Jerusalém Oriental, mostrou que a guerra de Israel na Faixa de Gaza melhorou o estatuto político do Hamas, ao mesmo tempo que conduziu a um revés na popularidade da Fatah, da Autoridade Palestiniana e dos seus principais líderes. A sondagem, que excluiu a Faixa de Gaza por razões de segurança, mostra uma clara divisão entre os palestinianos sobre a natureza de uma solução final – uma solução de dois Estados ou de um Estado. Houve também uma divisão de opinião sobre o melhor método de resistência palestiniana para alcançar os objetivos nacionais, entre resistência armada, militar ou resistência diplomática pacífica.
Algumas das conclusões do inquérito:
Quase 40% dos entrevistados acreditam que o ataque de 7 de outubro a Israel, e a guerra que se seguiu, servem os interesses nacionais palestinianos.
Mais de 41% dos entrevistados dizem esperar que a atual guerra termine a favor do Hamas.
Cerca de 38,5% dizem que a guerra terminará com o avanço dos projetos de normalização entre Israel e alguns estados árabes.
Pelo menos 44,5% dos inquiridos afirmam que a ação política diplomática e pacífica é o melhor método para alcançar os objetivos nacionais, enquanto 40,8% dizem que apoiam a resistência militar violenta.
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