Requiescat in Pace
Apesar de várias tomadas de posição no pós-25Abril difíceis de entender para muitos portugueses, não nos podemos esquecer que Otelo foi o responsável pela elaboração do plano global do golpe militar que pôs fim à ditadura do Estado Novo.
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José Maltez - Morreu Otelo. Ele foi Abril e um pedaço da ilusão do Império, filho de um alfacinha e de uma goesa, que tanto comandou o golpe que derrubou Marcello Caetano, como andou à procura de uma revolução proletária. Foi um pedaço do meu tempo e um português antigo. Quem o odiar, não nos compreende. Agradeço-lhe ter transformado em teatro político o que podia ter sido uma guerra civil. Matámo-nos menos.
João Baptista Vasconcelos Magalhaes - Morreu Otelo, mas ficará sempre como o símbolo do 25 de Abril. Quem o conheceu sabe que era um homem de ideais, mesmo quando foi polémico. A sua memória é a memória dos dias mais felizes da vida de quem conheceu uma noite de medo. Falar de Otelo tem de ser mergulhar no silêncio da memória do que ele nos trouxe de melhor, as suas utopias de um Portugal mais feliz e mais justo. Que esteja em paz!
Henrique Monteiro - Apesar de tudo, das prisões e mortes de que foi cúmplice, o 25 de Abril deve-lhe muito. Depois de saber que eu fora, com Rogério Rodrigues (melhor diria que foi ele com a minha colaboração) a denunciar que Otelo era o líder das FP25, nunca deixámos de falar. O mesmo se pode dizer de Vasco Lourenço, que no PREC não foi bem tratado por Otelo e puseram as divergências para trás. Como sempre, em Portugal, é tudo gente boa.
João Greno Brògueira - Apesar de todos os desvios, que entretanto a Democracia Portuguesa sofreu e de todos os que aproveitaram a oportunidade para assaltar o poder pós 25 de Abril... Obrigado Otelo Saraiva de Carvalho
David Ribeiro – Completamente de acordo, Brògueira… e é mesmo por isso que não posso esquecer que na madrugada de 25 de Abril de 1974 Otelo conduziu, juntamente com outros cinco oficiais, do Posto de Comando do Movimento das Forças Armadas no Regimento de Engenharia N.º 1 na Pontinha, as operações militares que derrubaram o decrépito Estado Novo. (Entre estes cinco oficiais encontrava-se o meu saudoso comandante do Batalhão de Engenharia N.º 3, o Tenente-coronel Fischer Lopes Pires)
João Geirinhas Rocha - Otelo. Assim, sem mais, uma personagem maior que o homem, luzes e sombras, utopias e delírios, bravatas e ingenuidades, coragem e fuga, muitas vidas para caber numa pessoa só. O Expresso revelou há anos que era bígamo, tinha e vivia tranquilamente com duas famílias. Não há melhor metáfora para resumir a figura.
Várias figuras nacionais reagiram à morte de Otelo Saraiva de Carvalho
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, reagiu à morte de Otelo Saraiva de Carvalho, lembrando o papel central de comando na revolução do 25 de Abril e apresentando as condolências à família. "É ainda cedo para a História o apreciar com a devida distância", escreveu na nota enviada.
"Otelo Saraiva de Carvalho foi o coordenador operacional da ação militar do Movimento das Forças Armadas, que, no dia 25 de abril de 1974, derrubou o regime do Estado Novo, pondo fim à mais longa ditadura do século XX na Europa e abrindo caminho à democracia", referiu o Governo em comunicado.
"Se este país fosse justo, deveria ter morrido na prisão". Foi assim que André Ventura, líder do Chega, reagiu à morte do Capitão de Abril Otelo Saraiva de Carvalho.
O presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, homenageou hoje Otelo Saraiva de Carvalho, "o maior símbolo individual do Movimento das Forças Armadas", que concretizou o sonho de todos os que "ansiavam por viver em liberdade".
A ativista política e médica Isabel do Carmo lamentou a morte de Otelo Saraiva de Carvalho, considerando que, com o desaparecimento do militar e estratego do 25 de Abril de 1974, "acaba também uma época e uma utopia". "Esta manhã [ao saber da notícia da morte] senti uma coisa, senti que acabou, que, com [a morte de] este homem, acaba também uma época, uma utopia. Senti isso, emocionalmente. Senti a perda, o desaparecimento. Já não vai ser possível falar com ele", afirmou Isabel do Carmo a agência Lusa. Para a antiga dirigente do extinto do Partido Revolucionário do Proletariado (PRP), movimento que exerceu atividade clandestina através das suas Brigadas Revolucionárias (no PRP-BR), Otelo é, juntamente com Vasco Lourenço, "o dirigente do 25 de abril [de 1974], do Movimento dos Capitães e do derrube da ditadura".
O PCP registou este domingo o papel de Otelo Saraiva de Carvalho no 25 de Abril, considerando que o momento da sua morte "não é a ocasião para registar atitudes e posicionamentos que marcam o seu percurso político". "Sobre o falecimento de Otelo Saraiva de Carvalho deve registar-se no essencial o seu papel no levantamento militar do 25 de Abril. O momento do seu falecimento não é a ocasião para registar atitudes e posicionamentos que marcam o seu percurso político", refere uma nota do gabinete de imprensa do PCP. O Partido Comunista Português endereça ainda condolências à família e à Associação 25 de Abril.
Tweet de Rui Rio - O dia da morte de Otelo Saraiva de Carvalho é momento para reconhecer o seu papel corajoso e decisivo no 25 de Abril e na conquista da liberdade. Competirá à História fazer, com isenção, a avaliação global de tudo que ele fez de bom e de mau. Hoje, não é o dia para isso.
Declaração do ex-Presidente Ramalho Eanes - A notícia da morte do Otelo Saraiva de Carvalho magoou-me e surpreendeu-me. Magoou-me, por se tratar de mais um amigo que parte. Surpreendeu-me, porque estive, recentemente, com o Otelo, no funeral da sua mulher, e achei-o, naturalmente, abatido, mas, aparentemente, com vigor e saúde. Conheci o Otelo na Guiné, onde o substituí na Direcção da Secção de Radiodifusão e Imprensa do Comando-Chefe. Tornámo-nos amigos. Foi, aliás, essa amizade que me levou a testemunhar em seu favor no julgamento a que foi submetido, apesar de muitos reparos e apelos para que o não fizesse. O Otelo era um homem bom, generoso, embora, por vezes, pouco prudente, pouco realista – contraditório, mesmo. Adorava representar, até na vida real, esquecendo que a representação exige um espaço delimitado, em que tudo o que aí é normal não o é na vida real. Para mim, e apesar de todas as contradições, o Otelo tem direito a um lugar de proeminência histórica. E tem esse direito, apesar da autoria de desvios políticos perversos, de nefastas consequências, porque foi ele quem liderou a preparação operacional do 25 de Abril, a mobilização dos jovens capitães, o comando da operação militar bem-sucedida. E penso assim porque entendo que um Homem é uma unidade e continuidade, uma totalidade complexa, e que só é bem julgado quando considerando, historicamente, esse quadro e o seu contexto. Mas há homens que, num momento histórico especial, se ultrapassam, ganhando dimensão nacional, indiscutível, porque souberam perceber e explorar uma oportunidade histórica única, e sentir os anseios mais profundos do seu povo. Otelo é uma dessas personalidades. A ele a pátria deve a liberdade e a democracia. E esta é dívida que nada, nem ninguém, tem o direito de recusar.
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